Vamos passar lá no Pessoa, minha gente!!!!!!
Pessoa?!!!
Quem?! Uma pessoa, uma gente, um homem, uma mulher, um menino, uma menina?!!!
Não, Quim.
Pessoa é Fernando Pessoa: um português que fez sucesso na Europa, no mundo e no Brasil, mesmo escrevendo poesias e livros, daqui de Lisboa. Escreveu um monte de coisas bonitas e admiradas por todos.
Ele viveu entre 1888 e 1935. Veja que tem muito tempo isso; mais de oitenta anos atrás. Nem seus avós tinham nascido ainda.
Era um homem inteligente, traduzia livros do inglês para o português e deste para o inglês. Era, realmente um homem sabido e respeitado no mundo afora.
Tem uma particularidade, ele também usava alguns nomes para publicar seus escritos, suas poesias – sabe como seu avô usa o Tonho do Paiaiá ?! – isso mesmo: ele usava outros nomes, o mais conhecido deles Álvaro de Campos.
A isso se dá o nome de heterônimos ou pseudônimos: as pessoas usam um nome diferente dos delas e são conhecidas assim, como alguns artistas de novela ou teatro fazem sempre.
Você sabia que o nome de Sílvio Santos não é Sílvio Santos? É outro, Senor Abravanel. Como muitos outros que você vê na televisão, por exemplo e, em alguns casos, no Youtube, daqueles rapazes ou moças que fazem “live” que você tanto gosta.
Sim, tudo bem; tudo bem!
E o que vocês tanto falam em ir “lá no Pessoa”?!
Vocês mesmos dizem que ele já morreu há muitos, muitos anos!
É apenas uma forma de dizer, Quim!
Na verdade, a gente está chamando pra ir à praça onde fica a estátua de Fernando Pessoa.
Estátua?! Que é isso?!!!
É como se fosse um retrato igual à própria pessoa. Pronto: como se fosse um boneco de cera, de barro, de ferro, de bronze, de plástico, igual ao corpo da própria pessoa – mais ou menos igual àqueles de super-homem, homem aranha, etc., que você tanto brinca.
Ah, tá! Agora entendi.
E como que eles fizeram este boneco de quem já morreu tem tanto tempo?! Onde acharam o corpo dele pra fazer a forma?!
Olha Quim, você já ouviu falar em artista plástico? É uma pessoa que estuda e faz desenhos, quadros, pinturas e cópia de coisas, animais ou gente mesmo. O artista, a partir de uma fotografia de alguém, elabora o molde, a forma e depois, na oficina, dele faz a cópia, que alguns chamam imagem, outros réplica e alguns outros estátua.
É uma forma de homenagear as pessoas importantes ou que fizeram o bem, ou que escreveram poemas, livros, etc.; de dizer que a pessoa foi ou é importante para o país, para o mundo, para a arte, para a literatura, para o futebol, para a história.
Você tá lembrado que lá em Salvador tem a Praça Castro Alves?! Lá onde os trios elétricos se reúnem para se despedirem do carnaval?!
Sim, sim. Uma vez passei por lá com meu pai e vi um homem em pé, parado e com o braço pra frente, não sei mostrando, apontando ou pedindo o quê! Só sei que tá lá que não se move do lugar.
Pois. Aquilo ali é uma estátua de Castro Alves que o governo mandou fazer pra homenagear o poeta baiano e colocou na praça com o nome dele. Não é legal isso?!
Sei lá! Isso é coisa de vocês adultos. Eu só “sou um pré-adolescente” não sei tudo isso que vocês sabem ainda não!
Então, vamos pegar o elétrico ou o comboio para irmos pra lá.
Ôxi! Elétrico?!!! Vocês vão é tomar um choque daqueles grandes e cair sentados.
Lá na escola a professora disse que não se deve pegar onde tem energia elétrica porque dá choque e pode até morrer.
Não, Quim! Elétrico aqui é como eles chamam o bonde. Um pequeno trem, movido a eletricidade; como se fosse um pedaço de metrô que anda pelo meio da rua, para transporte de pessoas.
Sim. E o que é comboio?
Comboio é o mesmo que trem; só que bem maior, com vários vagões, serve para transporte de pessoas e de cargas.
Deslocam-se ao largo do Chiado, onde se deparam com o Pessoa – em bronze – “em frente ao Café a Brasileira, um local histórico fundado em 1905, onde os poetas e escritores se reuniam nas mesas na calçada para debaterem sobre assuntos culturais.”
Inevitável o papo reto entre o Pessoa de bronze e o pessoinha em carne e osso, de nome Joaquim, mas carinhosamente tratado por todos de Quim – um brasileirinho, baiano, muito curioso e de mente aguçada.
O Quim, tomou de uma cadeira de um daqueles cafés, e sentara-se ao lado esquerdo do Pessoa.
Entendo desnecessário lhes dizer da felicidade de poder papear com um dos maiores poetas lusitanos.
Quim: de perna cruzada e ostentando óculos escuros, atento a tudo que se passava, se dirigira ao Pessoa, e, educadamente, fala à estátua – posso sentar aqui ao seu lado, poeta Pessoa, pra gente levar um papo reto?
Pessoa: diz-me cá ó miúdo, donde tu vens, qual o teu nome? Estás a sós?
Quim: ôôô seu Pessoa, sozinho não pode ser, não é?! Sou um miúdo, como o senhor disse, não posso viajar sozinho; estou com minha mãe, minha avó e minhas tias. Meu nome é Joaquim, mas me chamam Quim, sabe; venho da Cidade do Salvador, Estado da Bahia, a primeira Capital do Brasil, que por sinal foi fundada por um conterrâneo do senhor.
Pessoa: ora pois, miúdo Joaquim, então tu és das terras do poeta Castro Alves, de quem muito admirei as poesias, principalmente pela cruzada firme e corajosa em favor dos escravos!. Estou a ver que és muito sagaz e senhor de si quando falas. Diz a mim, chegastes hoje a Lisboa?
Quim: Olha só seu Pessoa, que legal hein! Lá em Salvador tem uma estátua desse poeta que o senhor falou. Só que ele está em pé com a mão estirada e colocaram num lugar bem alto, por isso não dá pra gente conversar com ele como estou conversando com o senhor; só o povo do trio elétrico, eu acho, nos último dia de carnaval, que ficam todos arrodeando ele, tocando e cantando músicas. Não seu poeta, nós chegamos ontem. Estávamos na casa de minha “Tia Doce”, em Munique, Alemanha, ali bem pertinho daqui. Creio que o senhor conheça, afinal é aqui na Europa.
Pessoa: mas, o que fazes a cá em terra de além mar, ó miúdo? Vieste somente a me ver? ou a passear e apreciar as coisas bonitas de Lisboa? Tu já leras alguma poesia minha?
Quim: somente a ver o senhor?!!, nãooooo!!! Vim passear, conhecer os lugares bonitos da cidade e, aproveitei pra levar um papo reto com o senhor. Lá na minha escola a professora disse que o senhor é um dos maiores poetas de Portugal e que fez muito sucesso também lá no Brasil. Como sou ainda muito novo, não leio poesias de adulto, o que é uma pena. Mas prometo ao senhor que quando crescer vou ler um montão delas.
Pessoa: “levar um papo reto”?! De que falas tu, ó miúdo? Não dou a conhecer este teu falar, aliás pouco usual cá entre nós portugueses; “papo reto”?! o que é isso, podes me explicar?!
Quim: mas poeta, então o senhor não sabe?!!!, nada demais falar assim. Sempre usamos estas palavras quando queremos levar uma conversa frente a frente com qualquer amigo ou colega. Isto é, conversar numa boa, falar do que quiser falar e bem entender, etcetera e tal.
Pessoa: ora pois, miúdo Joaquim, só agora estou a saber, por ti, de que conversar com alguém é “levar um papo reto”. No tempo que estive a fazer poesias e escrever livros não se falava nesse tal de “papo reto”, do que deduzo ser uma gíria usada por vocês jovens dos tempos atuais.
Quim: seu Pessoa, gostei muito de papear com o senhor. Vou dizer lá no Brasil que lhe conheci e que levamos aquele papo reto. Muito obrigado por me ouvir e me dizer das coisas de Portugal.
Pessoa: ó miúdo Joaquim, cá estou eu em alegria por ter conversado contigo e saber que tens interesse em, no futuro, ler poesias minhas. Eu é quem te agradeço por este momento tão singelo e especial.
Papo encerrado, entre o Pessoa, o português de bronze, e o pessoinha de carne e osso, o miúdo brasileiro, o Joaquim, nosso Quim.
Dá-se a ver que fora uma conversa bem centrada e cheia de curiosidades. Um a falar o português originário e outro falando o português adaptado e corrente em seu país.

Tonho do Paiaiá
Em distanciamento social e com saudade do meu Quim.
Reserva Imbassaí –– 4 de abril de 2020